sexta-feira, 22 de julho de 2011

Américas antes de Colombo - Parte 10: mundo andino, cultura Chavín

O mundo andino
O surgimento da civilização na América do Sul repetiu muitos dos processos da Mesoamérica, mas foi também condicionado pelas características geográficas sul-americanas. O mundo andino apresentou a homens e mulheres uma geografia peculiar de microrregiões complexas com mudanças extremas de altitude e temperatura. A estreita e árida faixa costeira ocidental, cortada pelos poucos rios que fluíam para o Pacífico, rapidamente abria caminho para os altos Andes, onde alguns picos se elevam acima de 4.500 metros. Entre as duas principais cadeias dos Andes existem vales elevados e estepes, ou punas, que formam as terras altas, ou altiplanos. Nesses planaltos frios (normalmente acima de 3.000 metros), o solo é relativamente nivelado e há água suficiente. Batatas e milho poderiam crescer e as estepes forneciam bons pastos para lhamas e alpacas, o “rebanho dos Andes”. As populações andinas se concentravam nos altiplanos ou no litoral árido nos vales dos rios que tornavam a irrigação possível. Nos declives orientais dos Andes, vários grandes rios corriam em direção à floresta tropical concentrados nas bacias dos rios Amazonas e da Prata. Estes declives são as montanhas úmidas, onde frutas tropicais e a folha de coca podem ser obtidas.
Esta topografia acidentada impôs limitações e criou oportunidades para a civilização se desenvolver. Os áridos vales costeiros demandavam irrigação, e isto estimulava o crescimento populacional e a complexidade social. Os projetos de irrigação eram enormes, envolvendo milhares de canais e diques que requeriam manutenção e construção constantes. A necessidade por irrigação criou o estado, ou a irrigação resultou da formação da autoridade centralizada? Os acadêmicos discordam, mas está claro que uma vez formados, uma função importante dos estados costeiros era a irrigação. Nos altiplanos, a irrigação e o cultivo em terraços aumentaram o suprimento de comida nas regiões onde a quantidade de terras aráveis era limitada. As populações se concentravam nos vales férteis, mas estavam separadas umas das outras por montanhas escarpadas. O comércio e a comunicação eram difíceis. Isto levou a projetos grandes e bem organizados para construir estradas, pontes e terraços agrícolas. As razões para a construção estatal eram boas. As imagens de guerra e militares e as cabeças troféus vistas na maior parte da arte peruana representam um mundo de recursos limitados e competição.
No mundo andino, mudanças verticais abruptas criaram microclimas dentro de distâncias relativamente curtas. Os povos e até mesmo comunidades individuais ou famílias tentavam controlar várias zonas ecológicas onde diferentes tipos de safra poderiam ser cultivados. Uma comunidade poderia residir no altiplano cultivando batatas e quinoa, um grão andino, mas também poderia ter campos nos vales mais baixos para plantar milho, pastos a quilômetros de distância nas elevações mais altas para seus lhamas e até mesmo uma colônia externa nos declives úmidos para fornecer algodão, coca e outros produtos tropicais. De fato, o acesso a essa variedade de zonas ecológicas por colonização, ocupação, conquista ou comércio parece ter sido uma característica constante na vida andina que determinou os padrões pré-colombianos de assentamento e influenciou o desenvolvimento histórico do mundo andino.

Desenvolvimentos pioneiros e o surgimento da cultura Chavín
A maior parte dos primórdios da história andina se adapta a um padrão de alternância entre períodos de descentralização, nos quais vários centros locais ou regionais desenvolveram culturas singulares, e períodos onde um desses centros parece ter estendido seu controle sobre áreas muito grandes, estabelecendo um horizonte cultural sob uma autoridade centralizada. Entre 3000 e 2000 AEC, povoações agrícolas permanentes estavam estabelecidas nas terras altas andinas e na costa árida do Pacífico. O milho foi introduzido a partir da Mesoamérica e era cultivado junto com safras nativas tais como a batata. Por volta de 2700 AEC, já se produzia cerâmica, primeiro no litoral norte (atual Equador) e depois no altiplano do Peru central. Esta primeira cerâmica, conhecida como artigos Valdivia, indica técnicas avançadas de produção. É consideravelmente similar às cerâmicas japonesas do período Jomon, e isso tem levado alguns acadêmicos a sugerir a hipótese de um contato transpacífico de pescadores japoneses. Quaisquer que sejam as origens da cerâmica na região, a presença de agricultura sedentária, artigos cerâmicos, tecelagem e povoações permanentes sinalizavam um nível de produtividade que logo foi seguido pela evidência de organização política. Os sítios mais antigos, como El Paraíso no litoral peruano, contêm construções monumentais de grande tamanho, mas pouco se sabe sobre as sociedades que as edificaram.
Entre 1800 e 1200 AEC, centros cerimoniais com grandes edificações de pedra foram construídos tanto nas terras altas quanto no litoral. A cerâmica agora estava amplamente distribuída; o lhama foi domesticado; e a agricultura se tornou mais complexa, com evidências de irrigação simples em alguns lugares. O mais importante desses centros era Chavín de Huántar (850-250 AEC), no altiplano peruano. Chavín continha várias plataformas templo e construções de adobe e pedra. Seus artesãos trabalhavam com cerâmica, tecidos e ouro. A cultura Chavín era caracterizada por motivos artísticos que estavam amplamente difundidos através da maior parte da região andina e parece representar um culto ou um sistema de crenças religiosas. Jaguares, cobras, aves de rapina e humanos com características felinas eram usados como decorações, muitas vezes junto com cenas de guerra e violência.
O estilo artístico era tão amplamente difundido que os arqueólogos se referem a essa época como um horizonte (Primeiro Horizonte), um período no qual parece ter existido uma autoridade central ampla que integrava uma região extensamente dispersa. Na verdade, não se sabe se a religião de Chavín foi disseminada por conquista, comércio ou atividade missionária, nem se sabe também suas origens. Ela tem algumas similaridades estilísticas notáveis com a arte olmeca da Mesoamérica; alguns arqueólogos têm apontado certas características tropicais em ambas e sugerem a planície amazônica como um possível ponto da origem de das duas tradições.
A evidência de guerra nas primeiras sociedades agrícolas peruanas talvez indique um processo geral. Com o desenvolvimento da agricultura intensiva e com uma quantidade limitada de terra arável, a organização da irrigação e a criação da autoridade política e finalmente de estados que poderiam recrutar para proteger ou expandir as terras disponíveis, foi uma necessidade vital.

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