quarta-feira, 20 de julho de 2011

Américas antes de Colombo - Parte 8: astecas - sociedade, religião e ideologia de conquista

O contrato social asteca
De acordo com as considerações astecas dessa história, uma transformação social e política também aconteceu. Acampichtli, o primeiro governante, criou uma nobreza, ou pipiltin, a partir das principais famílias por casamento com alguns nobres de Culhuacán que podiam traçar suas origens aos toltecas. Quando a guerra com Azcapotzalco estourou, os plebeus relutaram em lutar; mas a nobreza os encorajou e prometeu vitória. De acordo com a versão asteca oficial, os pipiltin prometeram obediência aos plebeus para sempre se eles perdessem, e os plebeus fizeram promessa similar se os nobres conseguissem a vitória. A conquista de Azcapotzalco assegurou a posição da nobreza. Além disso, o governante de Tenochtitlán emergiu desse processo não mais como um porta-voz de um conselho geral, mas como um governante supremo com amplos poderes. Os governantes seguintes expandiram o poder e as fronteiras do controle asteca. Moctezuma I (1440-1469) conquistou áreas em torno do platô central. Sob seu irmão Ahuitzotl (1486-1502), o império alcançou sua maior extensão – de costa a costa e com algumas áreas sujeitadas bem ao sul, embora o reino tarascano a noroeste permanecesse independente. Moctezuma II (1502-1520) consolidou a conquista do México central e, embora alguns poucos estados independentes permanecessem dentro do México central, a dominação asteca se estendia da fronteira tarascana até a região maia. Os povos subjugados eram forçados a pagar tributo, entregar terras e, às vezes, prestar serviço militar ao crescente Império Asteca.
Qualquer que seja a explanação oficial dos eventos, parece claro que a sociedade asteca foi transformada no processo de expansão e conquista. A partir de uma associação de clãs pouco rígida, os mexicas se tornaram uma sociedade estratificada sob a autoridade de um governante supremo de grande poder. Uma figura central nestas mudanças foi Tlacaelel, um homem que serviu como um tipo de primeiro-ministro e conselheiro sob três governantes de 1427 até a sua morte por volta de 1480. Sob sua direção, as histórias foram reescritas e aos mexicas foi dada uma autoimagem como um povo escolhido para servir os deuses. O sacrifício humano, há muito tempo parte da religião mesoamericana, foi consideravelmente expandido sob sua direção em um culto de enormes proporções no qual a classe militar desempenhava uma função central como fornecedores de cativos de guerra para serem usados como vítimas de sacrifício. Supostamente, à dedicação do grande templo durante o reinado de Ahuitzotl, mais de 10.000 vítimas foram sacrificadas. Também era uma política de Tlacaelel deixar alguns territórios inconquistados, de forma que periódicas guerras fossem organizadas nas quais ambos os lados poderiam obter cativos para sacrifício. Qualquer que fosse a motivação religiosa para esse culto, Tlacaelel e os governantes astecas os manipulavam como um recurso efetivo de terror político. Na época de Moctezuma II, o estado asteca era dominado por um rei que representava o poder civil e que servia como um representante dos deuses na Terra. O culto do sacrifício humano e da conquista estava unido ao poder político do governante e da nobreza.

Religião e a ideologia de conquista
A religião asteca incorporava muitas características que há muito faziam parte do sistema de crenças mesoamericano. A religião era uma força poderosa, unificadora e às vezes opressiva na qual pouca distinção era feita entre o mundo dos deuses e o mundo natural. As deidades tradicionais da Mesoamérica – os deuses da chuva, do fogo, da água, do milho, do céu e do sol, muitos dos quais eram cultuados desde a época de Teotihuacán – eram conhecidos e venerados entre os astecas.
Havia pelo menos 128 deidades importantes, mas o número de deuses, na prática, parecia incontável porque muitas vezes cada deidade tinha uma consorte de forma feminina. Isto se deve ao fato de que uma dualidade básica era reconhecida em todas as coisas. Além disso, os deuses podiam ter diferentes formas ou manifestações de certa forma como os avatares das deidades hindus. Frequentemente cada deus tinha pelo menos cinco aspectos, cada um associado com as direções cardeais e com o centro. Pensava-se que certos deuses como sendo os patronos de cidades específicas, grupos étnicos ou ocupações. Era um panteão abrangente sustentado por um ciclo de festivais anuais e um cerimonial altamente complexo que envolvia várias formas de banquetes e danças junto com penitência e sacrifício.
Esta confusa disposição de deuses pode ser organizada em três temas ou cultos principais. O primeiro era dos deuses da fertilidade e do ciclo agrícola, como Tlaloc, ou o deus da chuva (chamado de Chac pelos maias) e os deuses e deusas da água, do milho e da fertilidade. Xipe Totec, por exemplo, representava a ressurreição agrícola. Seu culto era horrível. As vítimas sacrificadas a ele era esfoladas, e um sacerdote então vestia a pele para representar o novo crescimento do milho. Um segundo tema centralizado nas deidades criadoras, os grandes deuses e deusas que trouxeram o universo à existência. A história de suas ações desempenhava um papel central na cosmografia asteca. Tonatiuh, o deus guerreiro do sul, e Tezcatlipoca, o deus do céu noturno, estavam entre os deuses mais poderosos e respeitados pelos povos do México central. A maior parte do pensamento abstrato e filosófico asteca era devotada ao tema da criação. Finalmente, o culto da guerra e do sacrifício construído sobre as tradições mesoamericanas preexistentes que tinha sido expandido desde a época tolteca, mas que, sob o estado militarista asteca, tornou-se o culto do estado. Huitzilopochtli, o patrono tribal asteca, tornou-se a figura central desse culto, mas ele também incluía Tezcatlipoca, Tonatiuh e outros deuses.
Os astecas reverenciavam as grandes deidades tradicionais – tais como Tlaloc e Quetzalcoatl, o antigo deus da civilização – tão sagradas para os toltecas, mas sua própria deidade tribal, Huitzilopochtli, tornou-se suprema. Os astecas o identificavam com o antigo deus do sol, e o viam como um guerreiro do céu do dia lutando para dar vida e calor ao mundo contra as forças da noite. A fim de realizar essa luta, o sol precisava de força – e assim como os deuses se sacrificavam pela humanidade, a nutrição que os deuses mais precisavam era o que havia de mais precioso: a vida humana em forma de corações e sangue. O grande templo de Tenochtitlán era dedicado a Huitzilopochtli e Tlaloc. A deidade tribal dos astecas e o antigo deus agrícola dos povos sedentários da Mesoamérica foram assim unidos.
Na verdade, enquanto o sacrifício humano há muito fazia parte da religião mesoamericana, ele se expandiu consideravelmente no período pós-clássico do militarismo. Os cultos guerreiros e as imagens militaristas de jaguares e águias devorando corações humanos eram característicos da arte tolteca. Os astecas simplesmente adotaram uma tendência existente e a levaram a uma escala sem precedentes. Os tipos e a frequência dos sacrifícios aumentaram, e um simbolismo amplo e religioso, que incluía canibalismo ritual, desenvolveu-se como parte do culto. Quanto do sacrifício asteca resultava de convicção religiosa e quanto era imposto como tática de terror e controle político pelos governantes e pela classe sacerdotal é uma questão ainda aberta a debate.
Sob a superfície desse politeísmo, também havia, no entanto, um senso de unidade espiritual. Nezhualcoyotl, o rei de Texcoco, compôs hinos ao “senhor das imediações”, uma força criativa invisível que apoiava todos os deuses. Apesar disso, sua concepção de um tipo de monoteísmo, muito semelhante ao do faraó Akhenaton no Egito, era muito abstrata e nunca conquistou grande popularidade.
Apesar dos aspectos sanguinários da religião asteca terem bastante atenção, pode-se também perceber que os astecas se interessavam com muitas das grandes questões religiosas e espirituais que preocupavam outras civilizações: Há vida depois da morte? Qual o significado da vida? O que significa viver uma vida boa? Os deuses realmente existem?
Nezhualcoyotl, cuja poesia sobreviveu na forma oral e foi escrita no século XVI, desejava saber sobre a vida após a morte:
         "As flores vão para a terra dos mortos?
         No além, estamos mortos ou ainda vivemos?
         Onde está a fonte de luz, visto que ela esconde o que dá a vida?"
Ele também queria saber sobre a existência dos deuses:
         "Você é real, você existe?
         Apenas você domina todas as coisas
         O doador da vida.
         Isso é verdade?
         Talvez, como dizem, não seja verdade."
A arte e a poesia religiosa astecas são repletas de imagens de flores, pássaros e de música – todos muito admirados pelos astecas – assim como de corações humanos e sangue – a “água preciosa” necessária para sustentar os deuses. É essa mistura de imagens que faz o simbolismo da religião asteca de tão difícil entendimento para os observadores modernos.
A religião asteca dependia de uma mitologia complexa que explicava o nascimento e a história dos deuses e suas relações com as pessoas e de um simbolismo religioso que infundia todos os aspectos da vida. Como já visto, o sistema de calendário mesoamericano era religioso em natureza, e muitas cerimônias coincidiam com pontos particulares no calendário cíclico. Além disso, os astecas também acreditavam em uma visão cíclica da história e que o mundo tinha sido destruído quatro vezes antes e que seria destruído novamente. Assim, havia certo fatalismo no pensamento asteca e uma premonição que, finalmente, os sacrifícios seriam insuficientes e os deuses trariam outra vez catástrofes. Caracteristicamente, no final de cada ciclo de 52 anos, todas as chamas e fogueiras no reino eram apagadas, e enquanto as pessoas esperavam apreensivamente, os sacerdotes tentavam acender uma nova fogueira na cavidade torácica de uma vítima sacrificial. Se os deuses aprovassem e o fogo acendesse, o mundo continuaria; o novo fogo era então levado por corredores com tochas para reacender todas as fogueiras no reino.

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