quarta-feira, 29 de junho de 2011

Os elamitas

O platô iraniano não experimentou o surgimento da civilização urbana e letrada no final do IV e no começo do III milênio AEC no padrão mesopotâmico, mas o vale do Kuzestão, no sudoeste do Irã atual, o fez. Lá existiu a civilização elamita.
Geograficamente, O Elã incluía mais que essa região; era uma combinação desses vales e das áreas montanhosas adjacentes a norte e a leste. A força elamita estava baseada na habilidade de manter estas várias áreas unidas sob um governo coordenado que permitia o máximo intercâmbio dos recursos naturais únicos de cada região. Tradicionalmente, isso era feito através de uma estrutura governamental federativa.
Muito relacionado a essa forma de governo era o sistema elamita de herança e distribuição de poder. O padrão normal de governo consistia de um soberano governando sobre príncipes vassalos, Nas épocas mais antigas, o soberano vivia em Susa, que funcionava como uma capital federal. Com ele governava seu irmão mais próximo em idade, o vice-rei, que normalmente tinha sua sede de governo na cidade nativa da dinastia governante. O vice-rei era o presumível herdeiro do soberano. Existia ainda um terceiro oficial, o regente ou príncipe de Susa (a região), que dividia o poder com o soberano e com o vice-rei. Ele normalmente era filho do soberano ou, se este não tivesse filhos, seu sobrinho. Com a morte do soberano, o vice-rei se tornava o senhor; o príncipe de Susa permanecia em sua posição, e o irmão seguinte em idade se tornava o novo vice-rei. Apenas se todos os irmãos estivessem mortos era que o príncipe de Susa era promovido a vice-rei, habilitando assim o soberano a nomear seu próprio filho (ou sobrinho) como o novo príncipe de Susa. Tal complicado sistema de controle governamental, balanços e herança de poder frequentemente era rompido apesar da descendência bilateral e do casamento levirato (o casamento compulsório da viúva com o irmão de seu falecido marido). O que é impressionante é que o sistema funcionava com frequência; apenas nos períodos médio e neoelamita é que os filhos mais frequentemente sucederam os pais.
A história elamita pode ser dividida em três fases principais: os períodos antigo, médio e neoelamita. Em todos os períodos o Elã esteve intimamente envolvido com Suméria, Babilônia e Assíria, às vezes através de comércio pacífico, mas mais frequentemente através de guerras. Da mesma maneira, o Elã foi muitas vezes um participante nos eventos do platô iraniano. Ambos os envolvimentos estavam relacionados às necessidades combinadas de todas as civilizações das planícies em controlar os povos guerreiros do leste e de explorar os recursos econômicos do platô.

Os reis mais antigos do período elamita antigo talvez datem de aproximadamente 2700 AEC. Já o conflito com a Mesopotâmia, neste caso aparentemente com a cidade de Ur, foi característico da história elamita. Estes primeiros governantes foram sucedidos pela dinastia Awan (Shustar). O décimo-primeiro rei dessa linhagem firmou tratados de aliança com o grande Naram-Sin de Acad (c. 2254-c. 2218 AEC). No entanto, logo surgiu uma nova casa governante, a dinastia Simash (provavelmente oriundos das montanhas do norte). O evento considerável desse período foi a virtual do Elã por Shulgi da III dinastia de Ur (c. 2094-c. 2047 AEC). Finalmente, os elamitas se rebelaram e derrubaram a III dinastia de Ur, um evento muito lembrado nos textos de lamentações e presságios mesopotâmicos. Por volta da metade do século XIX AEC, o poder no Elã passou para uma nova dinastia, de Eparti. O terceiro rei dessa dinastia, Shirukdukh, esteve ativo em várias coalisões militares contra o poder crescente de Babilônia, mas Hamurabi (c. 1792-c. 1750 AEC) prevaleceu e O Elã foi arrasado em 1764 AEC. O Primeiro Império Babilônico, no entanto, entrou em rápido declínio após a morte de Hamurabi, e não demorou muito até que os elamitas fossem capazes de se vingar. Kutir-Nahhunte I atacou Samsuiluna (c. 1749-c. 1712 AEC), filho de Hamurabi, e conseguiu impor uma derrota tão substancial aos babilônios que o evento foi lembrado mais de 1.000 anos depois numa inscrição do rei assírio Assurbanipal. Presume-se que com este golpe o Elã mais uma vez conquistou sua independência. Do fim da dinastia de Eparti, que deve ter ocorrido no final do século XVI AEC, nada se sabe, está sepultado em silêncio.

Após dois séculos dos quais as fontes nada revelam, o período médio elamita se iniciou com a ascensão ao poder da dinastia anzanita, cujas origens provavelmente estavam nas montanhas a nordeste do Kuzestão. A expansão política sob Khumbannumena (c. 1285-c. 1266 AEC), o quarto rei desta linhagem, progrediu rapidamente, e seus sucessos foram comemorados por sua assunção do título “Expansor do Império”. Ele foi sucedido por seu filho, Untash-Gal, contemporâneo de Shalmaneser I da Assíria (c. 1274-c. 1245 AEC) e fundador da cidade de Dur Untash (hoje conhecida como Tchogha Zanbil). Nos anos imediatamente seguintes a Untash-Gal, o Elã progressivamente encontrou-se em real ou potencial conflito com o poder crescente da Assíria. Tukulti-Ninurta I da Assíria (c. 1244-c. 1208 AEC) realizou campanhas militares nas montanhas do norte do Elã. Os elamitas sob Kidin-Khutan, segundo rei depois de Untash-Gal, reagiram com uma incursão devastadora e bem sucedida em Babilônia. Todavia, finalmente, o poder assírio parece ter se tornado muito grande. Tukulti-Ninurta conseguiu expandir, em um breve período, o controle assírio ao extremo sul da Mesopotâmia, e Kidin-Khutan desapareceu na obscuridade, terminando a dinastia anzanita.
Após um pequeno período de problemas dinásticos, a segunda metade do período médio elamita se iniciou com o reinado de Shutruk-Nahhunte (c. 1160 AEC). Dois reis igualmente poderosos e dois menos influentes se seguiram a esse fundador de uma nova dinastia, que provavelmente governava em Susa, e nesse período o Elã se tornou uma das grandes potências militares do Oriente Médio. Tukulti-Ninurta morreu por volta de 1208 AEC, e a Assíria entrou em um período de fraqueza interna e conflito dinástico. O elã rapidamente tirou vantagem desta situação fazendo extensivamente campanhas na região do rio Diyala penetrando no coração da Mesopotâmia. Shutruk-Nahhunte capturou Babilônia e levou para Susa como presa de guerra a estela na qual estava inscrito o famoso código legal de Hamurabi. Shilkhak-In-Shushinak, irmão e sucessor do filho mais velho de Shutruk-Nahhunte, Kutir-Nahhunte, ainda ansioso em tirar vantagem da fraqueza assíria, realizou campanhas bem mais ao norte, na região da moderna Kirkuk. Todavia, em Babilônia, a II dinastia de Isin liderou uma revolta nativa contra o controle elamita lá exercido, e o poder elamita no centro da Mesopotâmia foi finalmente rompido. O império militar elamita começou a encolher rapidamente. Nabucodonosor I de Babilônia (c. 1124-c. 1103 AEC) atacou o Elã e foi derrotado. Todavia, um segundo ataque babilônio se sucedeu, e todo o Elã foi aparentemente invadido, terminando com o período elamita médio.
É digno de atenção que durante o período elamita médio o antigo sistema de sucessão e de distribuição do poder parece ter se deteriorado. Progressivamente, o filho passou a suceder o pai, e cada vez menos se percebe a divisão de autoridade dentro de um sistema confederado. Isto provavelmente reflete um esforço para aumentar a autoridade central em Susa para a condução de campanhas militares efetivas no exterior e para manter as conquistas elamitas estrangeiras. O antigo sistema de regionalismo equilibrado com federalismo deve ter sofrido um conflito seccional e fraternal que então enfraqueceu o Elã e no período neoelamita deve ter tido suas raízes nos desenvolvimentos centrífugos dos séculos XIII e XII AEC.

Um longo período de escuridão separa o período médio do neoelamita. Em 742 AEC, um certo Huban-nugash é mencionado como rei do Elã. O país parece ter sido dividido em principados separados, com o poder central razoavelmente enfraquecido. Os cem anos seguintes testemunharam as constantes tentativas dos elamitas de interferir nos assuntos mesopotâmicos, normalmente em aliança com Babilônia, contra a constante pressão da expansão neoassíria. De vez em quando, eles tinham sucesso em sua política, tanto militar quanto diplomaticamente, mas no todo, foram forçados a desistir ante o crescente poder assírio. Problemas dinásticos elamitas locais foram de tempos em tempos agravados por interferências assírias e babilônias. Enquanto isso, o exército assírio reduziu gradualmente o poder elamita e a influência no Lurestão, ao norte. Com o tempo, essas pressões internas e externas resultaram no colapso quase total de qualquer autoridade central no Elã. Em uma série de campanhas entre 692 e 639 AEC, num esforço para organizar a bagunça política e diplomática que tinha se tornado uma dor de cabeça crônica para os assírios, os exércitos de Assurbanipal destruíram completamente Susa, encerrando assim a história da civilização elamita.

Um comentário:

  1. Ao que parece, o Elã enquanto nação que tenta controlar a região, fracassa sob sua própria incompetência diante da intenção de sozinha se firmar como potência hegemônica na exploração dos recursos regionais.

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